terça-feira, 19 de maio de 2015

Investigando a idade das trevas

Um acordo de cooperação entre a China e a União Européia, por meio da Agência Espacial Européia, pode oferecer a cientistas possibilidades promissoras de desvendar questões que estão na fronteira da ciência e assim ampliar o conhecimento sobre o Universo, o que significa remeter às nossas próprias origens, nas profundezas abissais do espaço-tempo.
O acordo, fechado na segunda-feira passada, segundo revela a revista científica Nature (Scientific American integra o grupo editorial da Nature) inclui um conjunto de 15 projetos discutidos entre a Agência Espacial Européia (ESA) e a Academia Chinesa de Ciências (CAS).
A primeira dessas iniciativas envolve o desenvolvimento de uma rede de satélite para orbitar a Lua e tirar partido do bloqueio das emissões de rádio emitidas pela Terra para investigar o espaço-tempo profundo e abordar a chamada Idade das Trevas, quando o Cosmos foi opaco à luz e a escuridão prevaleceu por um período estimado em 400 mil anos.
A estratégia da missão conjunta é aproveitar a passagem dos satélites pelo lado oculto da Lua (quase sempre confundido com o lado escuro da Lua, que não é real, como previne uma canção da banda inglesa Pink Floyd: “there is no dark side of the moon really”) para bloquear emissões de rádio da Terra.

Zona silenciosa em emissões provenientes da Terra, o lado oculto da Lua vai permitir que satélites captem emissões na frequência de micro-ondas e ondas longas de rádio provenientes de hidrogênio disponível numa época entre 370 mil e 550 milhões de anos após o Big Bang, a explosão que, segundo a teoria conhecida por este mesmo nome, deu origem ao Universo.
Talvez, aqui, valha a pena tecer pelo menos três considerações a este respeito.
Primeiro que Big Bang foi um termo pejorativo utilizado pelo cosmólogo inglês Fred Hoyle (1915-2001), em programas de rádio populares, para desacreditar uma origem para o Universo que na abordagem dele, conhecida como Estado Estacionário, seria eterno.
Mas o nome pegou e acabou batizando a teoria que inicialmente fora proposta pelo cosmólogo belga, o abade George Lemaître (1894-1966) e referida como “átomo primordial”. Vale a pena considerar ainda que a tradição, como na obra da escritora e mística soviética Helena Blavatsky (1831-1891), a origem do Universo está relacionada a um “ovo primordial”.
A segunda questão envolvendo o Big Bang é que pode não ter sido a explosão original, mas apenas a mais recente, de recriação do Universo que, neste caso, seria de fato eterno, ainda que diferente da maneira proposta por Hoyle.
O terceiro ponto é que “explosão”, apesar de muito difundido, não é um termo apropriado para se referir à origem do Universo. Neste caso, o mais conveniente é falar da manifestação de uma singularidade, um ponto com densidade e curvatura infinitos que deram origem ao espaço, tempo (agora unificados na estrutura espaço-tempo da relatividade geral) e à matéria, inicialmente sob a forma de energia.
A Idade das Trevas, que os cosmólogos querem investigar, e que essa associação entre a Agência Espacial Europeia e a Academia Chinesa de Ciências deve permitir, foi um período de 400 mil anos em que o Cosmos permaneceu opaco à luz devido às elevadas temperaturas que separaram átomos, especialmente de hidrogênio, em núcleos e suas partículas (um único elétron, no caso do hidrogênio). Isso criou uma cortina que não permitiu o fluxo da luz.
Apenas com a queda de temperatura, possibilitada pela expansão do Universo, que ocorre ainda hoje, permitiu o aparecimento de átomos e a transparência cósmica à luz.
Essa época remota antecede a formação das estrelas e das galáxias e define a infância remota do Universo.
Ao investigar a Idade das Trevas, cosmólogos e astrofísicos querem conhecer como a criação do Universo manifestou-se e entender, entre outras questões, como se deu a formação de gigantescos buracos negros que se escondem nos núcleos galácticos. E como a energia escura, que não interage com a luz, mas se manifesta gravitacionalmente, atuou para moldar o Cosmos que, um dia, teria (possivelmente entre outras) a inteligência humana em busca dessa ocorrência fascinante.

A rede de satélites investigando o espaço-tempo profundo em busca de informações sobre a Idade das Trevas, quando concretizada, o quque deve ocorrer até 2021, antecede uma fase que agora ainda pertence à ficção científica. A de colocar telescópios de superfície, no lado oculto, da Lua para investigações quase impossíveis de serem feitas da Terra, devido as interferências nas emissões de rádio de uma infinidade de fontes.
Na verdade, vista de longe, a Terra é muito brilhante na frequência de rádio, que começa com micro-ondas, em seguida ao infravermelho distante, na radiação eletromagnética, e se estende às longas ondas de rádio, que podem chegar a quilômetros.
Esse brilho intenso em rádio deve sugerir, a uma eventual civilização alienígena, que a Terra abriga uma raça inteligente (conceito algo controvertido, se levado em conta brutalidades como guerra e outras ocorrências) que atingiu certo estágio tecnológico.
Uma das áreas que pode beneficiar-se desse “silêncio em rádio” oferecido pela proteção do corpo da Lua deve ser a pesquisa sobre eventuais outras civilizações cósmicas, trabalho iniciado em radioastronomia nos anos 60 pelo radioastrônomo americano, Frank Drake, nascido em 1930 e agora com 84 anos.

O trabalho de Drake teve sequência com outros cientistas que incluem Philip Morrison (1915-2005), Carl Sagan (1934- 1996) e Giuseppe Cocconi (1914-2008) entre outros notáveis exploradores da perspectiva alienígena.
Frank Drake também foi criador da chamada Equação Drake, uma estimativa para se calcular a quantidade de civilizações no Universo, numa sequência em uma única passagem, a capacidade de autodestruição, reduz as possibilidades à metade.
 Scientific American Brasil


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