sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

Cientistas revelam 'aquecimento oculto' que acelera degelo da Antárica


Plataformas de gelo: na Antártica, a água mais quente do oceano está derretendo os blocos por baixo
Foto: Science

A água nas profundezas do oceano em torno da Antártica ficou mais quente nas últimas décadas, aos poucos “comendo” por baixo as gigantescas plataformas de gelo que avançam do continente sobre o mar e ameaçando até a própria integridade do imenso manto gelado que o recobre. Embora há tempos os cientistas desconfiassem que este processo estava acontecendo, um grupo internacional de pesquisadores pela primeira vez verificou o aumento na temperatura da água próxima ao leito oceânico da plataforma continental antártica, em especial na sua porção Oeste, que estaria por trás do rápido derretimento das plataformas de gelo observado nesta região. Apesar de ainda não se saber se o processo é irreversível, caso apenas as plataformas de gelo sobre os mares de Amundsen e Bellingshausen, na Antártica Ocidental, venham de fato a sumir ao longo dos próximos séculos, o nível médio global dos oceanos vai subir quase cinco metros, inundando cidades e regiões costeiras que hoje são lar da maior parte da população da Terra.
 

 
A aceleração do derretimento do gelo nesta área tem sido observada há algum tempo, causando uma grande contribuição para a elevação do nível do mar no mundo inteiro — lembra Karen Heywood, pesquisadora da Universidade de East Anglia, no Reino Unido, e uma das autoras do estudo, publicado na edição desta semana da revista “Science”. — O que demonstramos é como as mudanças oceanográficas no último meio século provavelmente causaram este derretimento. Se a água continuar a se aquecer, a crescente penetração de massas de água mais quente nas plataformas de gelo vai acelerar ainda mais este processo, com grande impacto no ritmo de elevação do nível do mar.
De acordo com os resultados do estudo, a água sob as plataformas de gelo de ambos mares no Oeste da Antártica tem se aquecido a uma taxa de 0,1 a 0,3 grau Celsius por década desde os anos 1960 e sua temperatura hoje varia entre 0,5 e 1,5 grau Celsius. Embora essas temperaturas ainda pareçam muito baixas, os cientistas alertam que elas representam um significativo e crescente aumento da transferência de calor de outras áreas do planeta para o oceano austral.
Pode não parecer muito, mas é uma enorme quantidade de calor extra disponível para derreter o gelo — destaca Sunke Schmidtko, do Centro Helmholtz de Pesquisas Oceânicas de Kiel, na Alemanha, e principal autor do estudo.
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O glaciologista Jefferson Cardia Simões, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), explica que as plataformas de gelo também funcionam como “tampões” que bloqueiam o fluxo dos glaciares do manto sobre o continente em direção ao oceano. Sem elas, conta, não só o caminho ficará livre como seu derretimento acabará por “lubrificar” o processo, fazendo com que este fluxo fique ainda mais rápido. Além disso, ele lembra que por estarem “pousadas” diretamente sobre o oceano, as plataformas de gelo dos mares de Amundsen e Bellingshausen são mais sensíveis às variações na temperatura da água em volta da Antártica.
— As mudanças estão acontecendo muito rápido e não será um cenário muito bonito para o futuro se este processo continuar — diz. — Não é algo que vai acontecer da noite para o dia, e sim em 400 a 500 anos.
 
Ainda temos que esperar e ver se a região vai atingir um novo estado de equilíbrio e este processo vai parar em algum ponto, mas provavelmente estamos deixando de herança um grande problema para as futuras gerações.
Continente perde um Everest a cada dois anos
E, por enquanto, as perspectivas quanto a isso não são nada boas. Com uma cobertura de gelo de 2,1 quilômetros de espessura em média, a Antártica concentra cerca 70% de toda água doce da Terra que, se fosse totalmente derretida, elevaria o nível dos oceanos em 60 metros. Segundo outro estudo publicado hoje no periódico científico “Geophysical Research Letters”, feito por pesquisadores da Universidade da Califórnia em Irvine, nos EUA, e do Laboratório de Propulsão a Jato da Nasa com base em dados de satélites da agência espacial americana e da Agência Espacial Europeia (ESA), a taxa média de perda de gelo em todo continente antártico desde 1992 chega a 83 gigatoneladas (bilhões de toneladas) ao ano, ou o equivalente a um monte Everest, a montanha mais alta do mundo, com uma massa estimada de 161 gigatoneladas, a cada dois anos. Mas o levantamento indica que os glaciares do Mar de Amundsen estão perdendo gelo quase três vezes mais rápido do que apenas pouco mais de 20 anos atrás. Lá, o ritmo do derretimento subiu de 6,1 gigatoneladas em 1992 para uma média de 16,3 gigatoneladas anuais entre 2003 e 2009.








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